A esperança está fresca

Aprendi a apreciar frescor desde muito cedo. Mineira como vim ao mundo, soube que esse solo é feito de ladeiras. Para descê-las qualquer gravidade ajuda. Mas para subi-las?! Só o Santo Deus e os pés no chão para valer-me. E qualquer subida pede trégua. Nada mais inspirador que o vento acariciando o rosto e soprando o suspiro do meu fôlego. Na verdade, tem algo mais inspirador que o vento injetor de ânimo. Mais importante que o ânimo é a direção. Podemos estar animados e desorientados. É aí que a esperança que é esperança, faz sentido.

Pelo que esperamos? Essa é a direção que faz valer cada passo. No Salmo 23, tem uma ovelha que tem um pastor; tem um viajante que tem caminho, companhia e direção; tem um convidado que tem um anfitrião com banquete de boas-vindas. A esperança cristã faz seus aspirantes [que topam essa esperança por fé] serem testemunhas da provisão de Deus em cada agora até o para sempre. Essa é nossa real esperança que refrigera.

Falando em ‘cada agora’, nossa esperança não é apenas futura ou longínqua. A esperança futura molda nosso agora e é nosso grande presente a cada manhã. É aquela espécie de misericórdia renovada que te inspira em cada passo, em cada dia, em cada cenário novo ou insistente [velho]. Nesse sentido, nossa esperança é fresquinha como o pão nosso de cada dia. Te nutre na medida diária e te conduz até a eternidade.

Refrigério advindo da esperança tem aparições diversas e surpreendentes. Ela vem em forma de amigo, de comida, de abraço, de música, na melodia e embalo de nossos bons dias comuns. Poetizando como o Davi do Salmo, isso se manifesta na experiência da suficiência do Pastor nos propiciando pastos verdejantes, águas tranquilas, condução em paz, refrigério na alma, caminhos da justiça. Tudo isso, na constância do ‘por amor do seu Nome’. É uma bondade riquíssima, farta de beleza e permeada de surpreendente graça! Aparece em contornos e bonitezas que não estão escritas em sua totalidade, mas você a reconhece em cada olhar terno, no riso solto da criança, na flor que nasceu, no projeto que frutifica, no movimento do corpo que equilibra, na harmonia da canção, nos ritmos da graça que toca você nas singelezas de viver.

Contudo, o refrigério da nossa esperança não tem sua aparição apenas nos dias bons. Somos gente em viagem. Uma espécie de peregrinos que ainda não chegou lá. A trilha é cheia de ladeiras acima, de sóis escaldantes, de momentos escuros, de decisões não muito óbvias, de porquês não respondidos, de luto, de proximidade com a morte, de bafo de guerra, de pandemias e tantos outros dias e noites vividos na pele. Talvez enquanto escrevo essas palavras, para você elas não sejam apenas palavras, talvez sejam pedaços da sua dor real de hoje. É pensando nessa dor que com amor escrevo. E te convido a abrir os olhos lagrimejados para que vejamos a luz no dia/noite dessa nossa escuridão do dia triste. A bondade é que somos iluminados pela certeza de que quanto mais densa for essa escuridade, mais perto está o Senhor! Se quiser saber onde Ele está quando o dia é mau, olhe para Ele e verá que Ele está no mesmo lugar – habitando em você, chorando com você, reinando sobre você, sobre o mundo e sua plenitude. Deus chora as dores do mundo, vai junto da mãe na lida de arrumar o quarto do filho que já morreu. Ele chora sua saudade, ama você todo dia e não te deixa só. Ele frequenta aniversários de crianças órfãs. Ele se coloca ao lado dos que choram. Não se afasta quando o dia é de chorar. Deus chora. E por isso, ainda que você ande pelo vale da sombra da morte, não tenha medo, porque o frescor da esperança está com você na feição do bordão e do cajado, da proteção e do apoio. Ele está no vento a soprar seu rosto, é a mão que te guia na escuridão, Ele é sol nascente que brilha na sua janela e te convida a abri-la e contemplar. Ele é o Amor que dissipa o medo. Ele é. Ele está com você.

Mas, embora o dia de dores pareça gigante, dias de Golias não são para sempre. A dor e a morte não têm a palavra final. Por isso, a esperança cristã nos aponta a temporalidade para além da mediocridade de algumas dezenas de anos aqui. E é justamente essa visão positiva da vida vindoura que constituiu nosso refrigério supremo. Cada frescor de agora é um pequeno demonstrativo do sorriso que emoldura a esperança no porvir. Como o Salmo 23 poetiza e denota a bondade da boa notícia, haverá uma mesa posta talhada em cada detalhe bonito, um banquete realmente nobre com o Anfitrião da história que dá suas boas-vindas ungindo a cabeça com óleo, há um cálice transbordante denotando sua provisão abundante e generosa. Vamos voltar para o lar. Sim, ‘habitaremos na casa do Senhor por dias sem fim’. E até lá, há esperança fresca na bondade e misericórdia que nos acompanham todos os dias. Porque nossa esperança é o Autor da Vida, que quer seja nos dias ou maus ou bons, é o Pastor que não falta, o Fiel companheiro no caminho, é o Caminho, O Anfitrião que foi preparar lugar e, até lá, sendo seu povo, seremos conduzidos na companhia do Amor que dissipa o medo. Respira e vai.

Por Thalyse Santana